20 de Julho de 2015 Por Redação WebContent
A Ressonância Magnética é uma técnica recente (o primeiro protótipo ficou pronto em 1977), mas já revolucionou a maneira como diagnósticos médicos são realizados. Utilizando ondas de rádio e magnetismo – ambos são indolores e não fazem qualquer mal ao ser humano -, a técnica é capaz de gerar imagens detalhadas, em três dimensões, de órgãos e tecidos. Por isso, é muito utilizada na detecção de diversas doenças, como câncer, derrames e esclerose múltipla. Mas, para que estas imagens sejam formadas, é preciso muito mais do que magnetismo e ondas de rádio…
Parte essencial de exames médicos como os de Ressonância Magnética, que produzem imagens de nosso corpo, é organizar as informações obtidas pelo equipamento e examiná-las no computador para se chegar a um diagnóstico preciso e confiável.
Facilitar e aprimorar estes processos de análise de imagens são alguns dos objetivos das pesquisas do BRAINN coordenadas pelo professor Roberto Lotufo, da Faculdade de Engenharia Elétrica e Computação (FEEC) da Unicamp. Seu grupo trabalha no desenvolvimento de softwares que fazem o processamento e a análise de imagens cerebrais, e apoia estudos clínicos que utilizam ressonância magnética.
A seguir, algumas das principais linhas de pesquisa de Lotufo e colaboradores.
ESTUDANDO O CÉREBRO EM 3D, COM A AJUDA DOS SOFTWARES DO BRAINN
SKULL-STRIPPING
Após a captura de informações por ressonância magnética, a primeira etapa do processamento de uma imagem cerebral é chamada de Skull-stripping.
Para isso é utilizada a técnica de “skull-stripping”, método computacional que aprimora os resultados da ressonância e permite discernir tecidos e estruturas em maior resolução.
É nela que o software separa a calota craniana do cérebro, permitindo a análise de todas as outras imagens. Já existem ferramentas de Skull-stripping disponíveis, mas o grupo de Lotufo está desenvolvendo uma nova – com ela, os exames poderão ser feitos com maior rapidez e precisão.
“Os softwares atuais, em sua maioria, foram validados com o estudo de menos de 100 pacientes”, diz Lotufo. “Eles geralmente possuem uma alta taxa de erro e são bastante demorados. Para o nosso software, queremos utilizar uma base de mil pacientes para a validação. Pretendemos obter resultados dentro de um ano”.
O QUE É SKULL-STRIPPING?
Quando se faz um exame de ressonância, o equipamento obtém dados detalhados dos vários tecidos do corpo. Mas o médico nem sempre quer estudar todo este conjunto de informações. No caso de uma análise do cérebro do paciente, é importante separar quais são os tecidos de interesse.
INTERAGINDO COM AS ESTRUTURAS CEREBRAIS
O grupo de Lotufo também trabalha no desenvolvimento de softwares interativos. O objetivo é que os pesquisadores possam, com eles, analisar imagens de ressonância magnética de uma maneira inovadora.
“Nosso software permite a segmentação e visualização de regiões específicas do cérebro”, afirma Lotufo. “Cada região pode ser selecionada individualmente e analisada em diferentes níveis de contraste preto/branco”.
Segundo os pesquisadores, a ferramenta é mais precisa e mais rápida do que outras já disponíveis. Além disso, ela teria também a possibilidade de customização de acordo com o interesse de cada estudo. Mais testes ainda precisam ser feitos, mas a expectativa é a de que o software esteja disponível para todos que tiverem interesse em um prazo de seis meses.
DETECTANDO LESÕES
Outra linha de pesquisa busca desenvolver softwares que possam fazer a detecção e caracterização de lesões cerebrais. Os métodos já disponíveis são para doenças específicas, então o grupo pretende criar um que possa ser usado para diversas condições.
“Este software poderia ser aplicado em pacientes que têm lesões múltiplas no cérebro causadas por diferentes doenças”, explica Letícia Rittner, professora da FEEC e pesquisadora associada do BRAINN. “Para isso, usamos um método de aprendizado de máquina. A máquina é apresentada tanto a imagens de cérebros saudáveis quanto a cérebros que contêm lesões, sendo treinada para identificar e classificar o que é um tecido saudável e o que não é”.
ESTUDO CLÍNICO MAIS EFICIENTE = RESULTADO MAIS RÁPIDO
Lotufo e seu grupo também buscam aplicar técnicas computacionais para auxiliar estudos clínicos que envolvem imagens cerebrais.
O grupo colaborou, por exemplo, com pesquisa de Simone Appenzeller, da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. O estudo envolveu cerca de 400 pessoas e comparou o cérebro de pacientes de lúpus (ver box a seguir) com cérebros saudáveis para verificar se havia diferença no volume das estruturas cerebrais. Para isto, os pesquisadores utilizaram uma plataforma digital com diversas funcionalidades que melhoram o aproveitamento dos dados médicos.
O QUE É LÚPUS?
O lúpus é uma doença crônica (isto é, persistente) inflamatória. Atinge cerca de 250 mil pessoas no Brasil, na maior parte mulheres. Ela ocorre quando o sistema imune ataca tecidos e órgãos do próprio corpo. Pode afetar diversas estruturas de organismo, como por exemplo a pele, rins, coração e pulmões.
Estima-se que 50% de quem está com lúpus tenha o cérebro atingido. Nestes casos, a doença pode causar problemas de memória e cognição, confusão e fatiga. Apesar de ainda não haver cura, já existem tratamentos que ajudam a prevenir e remediar estas conseqüências. Quanto mais cedo o lúpus for diagnosticado e tratado, melhor.
“Oferecemos uma plataforma, desenvolvida por nós, para organizar os dados dos estudos clínicos, processar e analisar as imagens e gerar um relatório final”, diz Rittner. “Assim, o pesquisador não precisa se preocupar com a análise dos dados. Através da nossa plataforma, facilitamos a visualização das imagens, organizamos as informações e entregamos o resultado para ele”.
A plataforma também está sendo utilizada para estudos envolvendo febre reumática, coordenados por Appenzeller. O próximo passo é divulgar ainda mais a ferramenta no meio acadêmico.
O QUE É FEBRE REUMÁTICA?
Febre reumática é uma febre intensa, não-contagiosa, caracterizada por inflamação e dores agudas nas articulações. Na maior parte dos casos, atinge pessoas jovens. É causada pelo tratamento inadequada de infecções por bactérias, em especial os estreptococos.
“Estamos procurando pesquisadores interessados nesse tipo de suporte computacional para colaborar com novos estudos clínicos na área de imagens cerebrais”, diz Lotufo.
As várias frentes de pesquisa do BRAINN na área de ressonância magnética demonstram como a organização e análise de dados são fundamentais para o desenvolvimento científico e tecnológico. Através dos softwares no estado da arte programados nos laboratórios do CEPID, cientistas e profissionais da saúde do mundo inteiro serão capazes de compreender melhor a estrutura e função do cérebro humano – o que é sempre o primeiro passo para a criação de novos tratamentos e curas a doenças neurológicas, trazendo maior qualidade de vida para milhões de pessoas em todo o mundo.